segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Sobre Johnny Weir, campanhas de um só tema, tratamento e veganismo abolicionista

Postado por Gary L. Francione em seu blog em 31 de janeiro de 2010

Caros(as) colegas:
Conforme declarei em meu ensaio no blog, eu acho que a questão Weir foi uma má ideia. Dado que todos os patinadores estão usando couro, lã, etc., o esforço foi semelhante a tentar fazer com que uma pessoa num banquete de filé não consuma uma colher de chá da sua porção de sorvete.
A carta aberta da Friends of Animals a Johnny Weir é um perfeito exemplo daquilo que eu considero o problema central da abordagem campanhas centradas em um só tema: a carta é dirigida a Weir porque ele anunciou que planejava usar pele. Não foi uma carta aberta à equipe inteira, relativa ao uso de peles de animais, incluindo seus patins de couro ou quaisquer peças de vestuário de lã ou seda. Não há nenhuma distinção moral coerente entre pele, couro, lã e seda. Weir, de forma muito efetiva, desviou a atenção do assunto principal da carta aberta, fazendo, ele mesmo, essa simples observação.
Além disso, a carta aberta foca em questões de tratamento, e não no uso, o que eu considero inconsistente com uma abordagem abolicionista. Francamente, é irrelevante se a raposa foi morta numa fazenda de peles ou numa armadilha acolchoada, ou não acolchoada, ou de laço, etc. Se a raposa fosse criada num ambiente agradável e depois fosse morta sem dor, enquanto estivesse dormindo, ainda assim eu consideraria isso objetável. A carta aberta dá ao público a impressão de que o problema é como a raposa foi tratada, e não que a raposa foi usada.
Conforme escrevi (inúmeras vezes), menos sofrimento é sempre melhor do que mais sofrimento, e eu concordo com esta passagem da carta aberta: “Tanto num modo como no outro [fazenda de pele ou armadilha], não há nada de glamoroso nem bonito na crueldade sofrida por eles. E isso também não pode ser moralmente justificado”. Mas isso negligencia o fato de que, embora a crueldade seja uma questão importante, o ponto principal não é que a crueldade não pode ser moralmente justificada; o ponto principal é que o uso —por mais “humanitário” que seja— não pode ser moralmente justificado. Essa é a ideia que devemos apresentar clara e inequivocamente ao público, se for para algum dia sairmos do paradigma do uso “humanitário”.
E que diferença faz se as raposas são “bonitas”, coisa que foi mencionada duas vezes na carta aberta?  Se elas fossem feias, faria alguma diferença? É precisamente esse modo de pensar que nos leva a ficar preocupados com a matança dos bebês focas, mas menos preocupados com a exploração dos animais que achamos menos atraentes. Não deveríamos reforçar a noção de que os animais que importam (ou importam mais) são aqueles que achamos atraentes, assim como não devemos promover a noção de que aparece uma modelo “linda” num comercial vegano qualquer.
Eu apoio os esforços da FoA ou qualquer outro grupo ou pessoa que apoie o veganismo ético. Mas, de todo modo, promover o veganismo não equivale, necessariamente, a promover a abolição, a qual, pelas razões que já expus em meus livros, artigos e ensaios, exclui esses tipos de abordagens que focam no tratamento e envolvem campanhas centradas em um só tema. Essa é uma razão pela qual eu frequentemente uso a expressão vegano abolicionista. Nem todos os veganos são necessariamente abolicionistas.
Eu certamente desejo que a HSUS lance uma campanha “Seja vegano(a)”, mas, mesmo se a HSUS realizasse essa campanha, isso não a tornaria uma organização abolicionista. Se um grupo promove o veganismo e continua promovendo reformas e campanhas de um só tema, o fato de esse grupo promover o veganismo não significa que ele deixou de ser neobem-estarista. Na realidade, se a HSUS fizesse a campanha “Seja vegano(a)”, iria parecer que a HSUS e a FoA são muito semelhantes! (A FoA tem um certo número de campanhas centradas em um só tema). Talvez isso explique por que a FoA estava se opondo à abordagem “Seja vegano(a)” que pedi para a HSUS adotar. Talvez a FoA tenha tentado evitar se transformar numa “HSUS light” e ficar na segunda facção que Vincent Guihan identificou em seu ensaio Of HSUS and Hegemony: Abolitionist Veganism as a Rising Force [Da HSUS e a hegemonia: o veganismo abolicionista como uma força em ascensão].
Conforme mencionei no ensaio anterior, estendi um convite aberto a Priscilla Feral para que ela discuta essas questões comigo num podcast. Espero que ela aceite meu convite.


Gary L. Francione
© 2010 Gary L. Francione

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Tradução: Regina Rheda