quinta-feira, 31 de março de 2011

A lógica de uma dieta vegana

Postado por Gary L. Francione em seu blog em 31 de março de 2011

Caros(as) colegas:
Enquanto comermos animais e produtos de origem animal, o que é completamente desnecessário e serve apenas ao prazer do nosso paladar, continuaremos a usar animais para outros propósitos claramente frívolos. Em outras palavras, se você acha OK impor sofrimento e morte aos animais apenas porque gosta do sabor da comida com ingredientes animais, provavelmente não vai achar que circos, zoológicos, caça e roupas feitas com produtos animais são moralmente objetáveis.
Conseguir que as pessoas vejam que algo que elas fazem três vezes por dia, em todos os dias de suas vidas, é moralmente objetável é a chave para abrir os olhos delas à imoralidade de todos os usos de animais.
É realmente uma questão de lógica simples e senso comum.
Se você não for vegano(a), torne-se vegano(a). É fácil; é melhor para a sua saúde e o planeta. Mas o mais importante é que é a coisa moralmente certa a fazer.
Gary L. Francione
© 2011 Gary L. Francione
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Tradução: Regina Rheda

quarta-feira, 30 de março de 2011

Uso “compassivo” de animais é um absurdo

Postado por Gary L. Francione em seu blog em 30 de março de 2011

Caro(a) colega:
Direitos animais são um assunto binário: você explora animais ou se torna vegano(a).
Não há terceira opção.
Você não pode explorar “compassivamente”. Você simplesmente explora. Sua “compaixão” se trata de fazer você se sentir melhor quanto a continuar explorando animais. A exploração “compassiva” não tem nada a ver com a obrigação de justiça que devemos aos animais não humanos.
Justiça requer que paremos totalmente de usar animais. Exploração “humanitária” não passa de fantasia. Todo uso de animais envolve tortura. E mesmo se não envolvesse, e mesmo se pudéssemos tratar “humanitariamente” os animais que exploramos, não podemos justificar o uso e a morte dos animais para o prazer do nosso paladar, nosso sentido de moda, entretenimento ou qualquer outra finalidade.
Esteja certo(a): exploração animal “compassiva” é um absurdo, assim como escravidão “compassiva” e genocídio “compassivo” são um absurdo.
Se você não for vegano(a), torne-se vegano(a). É fácil; é melhor para a sua saúde e o planeta. Mas o mais importante é que é a coisa moralmente certa a fazer. Você nunca fará mais nada tão fácil e tão gratificante em sua vida.
Gary L. Francione
© 2011 Gary L. Francione
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Tradução: Regina Rheda

domingo, 20 de março de 2011

Nada a ver com ciência

Postado por Gary L. Francione em seu blog em 15 de março de 2011

Caros(as) colegas:
Mais uma vez, estão nos dizendo que não há realmente nenhuma diferença significativa ou qualitativa entre as plantas e os animais. No artigo No Face, but Plants Like Life Too [Sem rosto, mas as plantas também gostam da vida], Carol Kaesuk Yoon escreve que, embora ela tenha desistido de comer carne:
Minha entrada no que parecia ser o plano moral superior foi surpreendentemente desagradável. Senti que estava sendo combatida não só por um desejo bizarramente intenso de comer frango, mas também por pesadelos em que estaria comendo um magnífico filé malpassado — eu podia saborear distintamente o delicioso caldo que pingava — dos quais eu acordava em pânico, até perceber que tinha sido carnívora apenas na minha imaginação.
As tentações e os testes estavam por toda parte. O que mais me surpreendeu foi descobrir que eu realmente não podia explicar a mim mesma, nem aos outros, por que matar um animal era pior do que matar as muitas plantas que eu tinha passado a comer.
Ela descobriu que:
formular uma base verdadeiramente racional para não comer animais, pelo menos enquanto consumia outros organismos de todo tipo, era difícil, talvez até impossível.
Ela declara:
As plantas parecem não se importar com o fato de ser mortas, pelo menos conforme o que podemos notar. Mas talvez seja exatamente essa a dificuldade.
Diferente de uma vaca correndo e mugindo, as reações de uma planta a um ataque são, para nós, muito mais difíceis de detectar. Mas, exatamente como uma galinha correndo sem a cabeça, o corpo de um pé de milho arrancado do solo ou cortado em pedaços luta para se salvar, tão vigorosa e tão inutilmente quanto a galinha, mesmo se de modo muito menos óbvio ao ouvido e olho humanos.
O problema desse artigo é que ele está na seção Ciência do New York Times. Mas não há ciência no artigo.
Primeiro, ninguém duvida que as plantas são vivas e conduzem processos complicados de tudo quanto é tipo. Mas há uma diferença crucial entre as plantas e os animais.
A diferença entre o animal e a planta envolve a senciência. Isto é, os animais não humanos — ou pelo menos aqueles que exploramos rotineiramente — são claramente conscientes de percepções sensoriais. Os seres sencientes têm mentes; têm preferências, desejos ou vontades. Isso não quer dizer que as mentes dos animais sejam como as mentes dos humanos. Por exemplo, as mentes dos humanos, que usam linguagem simbólica para se orientar pelo seu mundo, podem ser muito diferentes das mentes dos morcegos, que usam a ecolocação para se orientar pelo mundo deles. É difícil saber. Mas isso é irrelevante; o humano e o morcego são ambos sencientes. Ambos são daquele tipo de seres que têm interesses; ambos têm preferências, desejos ou vontades. O humano e o morcego podem pensar sobre esses interesses de maneiras diferentes, mas não há como duvidar seriamente que ambos tenham interesses, inclusive o interesse em evitar dor e sofrimento, e o interesse em continuar existindo.
As plantas são qualitativamente diferentes dos humanos e dos não humanos sencientes, pois as plantas certamente são vivas, mas não são sencientes. As plantas não têm interesses. Não há nada que uma planta deseje, ou queira, ou prefira, porque não há nenhuma mente ali para se ocupar dessas atividades cognitivas. Quando dizemos que uma planta “quer” ou “precisa de” água, não estamos fazendo uma afirmação sobre o status mental da planta, assim como também não estamos fazendo uma afirmação sobre o status mental de um carro quando dizemos que seu motor “quer” ou “precisa de” óleo. Pôr óleo no meu carro pode ser do meu interesse. Mas não é do interesse do meu carro; meu carro não tem nenhum interesse.
Uma planta pode responder à luz do sol e a outros estímulos, mas isso não significa que a planta seja senciente. Se eu passar uma corrente elétrica por um fio ligado a uma campainha, a campainha toca. Mas isso não significa que a campainha seja senciente. As plantas não têm sistema nervoso, receptores de benzodiazepina, ou qualquer uma das características que identificamos com a senciência. E tudo isso faz sentido, em termos científicos. Por que as plantas desenvolveriam a habilidade de ser sencientes, quando não são capazes de fazer nada em resposta a um ato que as danifique? Se você encostar uma chama de fogo numa planta, a planta não pode fugir; ela fica exatamente onde está e se queima. Se você encostar a chama num cachorro, o cachorro faz exatamente o que você faria — grita de dor e tenta fugir da chama. A senciência é uma característica que evoluiu em certos seres para capacitá-los a sobreviver escapando de um estímulo nocivo. A senciência não serviria a nenhum propósito para uma planta; plantas não podem “escapar”.
Mesmo os jainas, que acreditam que as plantas têm um sentido (toque), reconhecem que as plantas e os animais (inclusive insetos) são qualitativamente diferentes, e proíbem comer animais, mas não proíbem comer plantas.
Segundo, se a Ms. Yoon estivesse realmente preocupada com a exploração das plantas, ela deveria reconhecer que, ao comer produtos animais, está consumindo ainda mais plantas do que estaria, se estivesse comendo as plantas diretamente. É preciso vários quilos de plantas para produzir um quilo de carne. Quando a Ms. Yoon senta para comer aquele “magnífico filé malpassado”, ela está consumindo cerca de 5 quilos e meio de plantas.
Portanto, se as plantas importarem no plano moral, e se a Ms. Yoon se importar com a moralidade, então, a menos que ela vá jejuar até morrer de fome, ela tem a obrigação moral de comer plantas porque comerá menos plantas se consumi-las diretamente, e evitará o sofrimento e a morte dos mamíferos, aves ou peixes, todos eles claramente sencientes à maneira dos humanos (a despeito de qualquer diferença cognitiva entre os humanos e os outros animais).
A Ms. Yoon argumenta que podemos duvidar de que alguns animais, como as esponjas, não tenham sensibilidade. Embora seja verdade que sempre existem áreas cinzentas, eu tenho certeza de que a Ms. Yoon não come muitas esponjas. Os animais que consumimos rotineiramente – vacas, frangos, porcos, peixes – são todos, inquestionavelmente, sencientes.
Então de que se trata esse artigo?
A resposta está no último parágrafo, que começa assim:
Meu esforço para renunciar à carne não durou mais do que uns dois anos.
A Ms. Yoon não queria continuar sendo vegetariana. Ela estava desejando aquele “magnífico filé malpassado”. Ela tinha de dizer a si mesma que não há nenhuma diferença entre as plantas e os animais, portanto é tudo a mesma coisa e então ela pode comer o filé com que estava sonhando. Mas isso realmente não tem nada a ver com ciência.
Nada é tão capaz de evocar uma preocupação súbita e apaixonada com as plantas quanto uma proposta para alguém não comer produtos animais ou um desejo de voltar a comê-los. Nada.
*****
Se vocês não forem veganos(as), tornem-se veganos(as). É fácil; é melhor para a sua saúde e o planeta. Mas o mais importante é que é a coisa moralmente certa a fazer.
Gary L. Francione
© 2011 Gary L. Francione
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Tradução: Regina Rheda

sexta-feira, 18 de março de 2011

Por que o veganismo deve ser a base

Postado por Gary L. Francione em seu blog em 15 de março de 2011

Caros(as) colegas:
Imaginem que vocês estejam conversando com um grupo de entusiastas de carros clássicos que guiam só pelo prazer de guiar e não para qualquer propósito em particular. De fato, essas pessoas acreditam que guiar carros clássicos por prazer é uma tradição importante e uma parte crucial de sua cultura; e todo dia elas entram em seus carros e saem guiando, simplesmente porque gostam muito de fazer isso e consideram isso uma parte integral do que elas são.
Se vocês fossem tentar argumentar com essas pessoas que é moralmente errado usar seus carros para guiar até um consultório a fim de fazer um exame médico, ou para levar um parente machucado ao pronto socorro, elas certamente pensariam que a posição de vocês não fazia o menor sentido. Afinal, elas acham que é aceitável guiar puramente por prazer. De fato, guiar por prazer é um aspecto importante de suas vidas. Por que elas iriam aceitar que guiar por uma razão importante é uma coisa má, quando acham que guiar pelo simples prazer de guiar é uma coisa boa?
Imaginem uma segunda situação. Em vez de tentarem convencer esse grupo de pessoas de que guiar por uma razão médica importante é errado, vocês afirmam que guiar por prazer até um determinado destino, que não é diferente de nenhum outro destino, é errado. Mais uma vez, o grupo que guia por prazer acharia a posição de vocês bizarra porque é inteiramente arbitrária. Por que guiar por prazer até um lugar é diferente de guiar até um outro lugar? E se elas fossem aceitar que é errado guiar até um destino escolhido arbitrariamente, isso deixaria em aberto a questão de se é errado guiar por prazer em geral. Sua amada atividade estaria ameaçada.
Essas simples hipóteses nos ajudam a entender as razões morais, lógicas e psicológicas de por que o veganismo deve ser a base do movimento pelos direitos animais e por que as campanhas de um só tema não fazem o menor sentido.
Comer animais: sofrimento e morte para o prazer do paladar
A maioria das pessoas come carnes e outros produtos animais. Ninguém sustenta que necessitamos comer esses produtos para ter uma ótima saúde; pelo contrário, as pessoas ligadas à medicina dominante estão argumentando, com cada vez mais frequência, que os produtos animais são nocivos à saúde humana. Mas, sejam as comidas de origem animal nocivas ou não, elas certamente não são necessárias. Até mesmo a conservadora American Dietetic Association reconhece isso:
A posição da American Dietetic Association é que as dietas vegetarianas apropriadamente planejadas, incluindo as dietas totalmente vegetarianas (veganas), são saudáveis, nutricionalmente adequadas, e podem oferecer benefícios na prevenção e no tratamento de certas doenças. As dietas vegetarianas bem planejadas são apropriadas aos indivíduos durante todos os estágios de suas vidas, incluindo gravidez, lactação, infância e adolescência, e aos atletas.
E sabemos que a criação de animais para consumo é um desastre ecológico.
A única justificativa que temos para o terrível sofrimento e a morte que impomos (mesmo nas condições mais “humanitárias”) aos 56 bilhões de animais terrestres e a um número desconhecido, mas provavelmente tão assombroso quanto esse, de peixes e outros animais aquáticos é que os animais têm um sabor gostoso. Participamos dessa matança impressionante de animais por razões de prazer, diversão e conveniência. Consumir animais por nenhuma boa razão é uma parte importante do cotidiano da maioria das pessoas. De fato, muitas pessoas acreditam que essa imposição completamente desnecessária de morte e de horrendo sofrimento é uma importante tradição; algo que integra nossa suposta “excepcionalidade humana”.
Vivissecção
Agora, imaginem-se tomando a posição de que o uso de animais em experimentos biomédicos é uma coisa errada. Como argumentei, há sérios questionamentos quanto à necessidade da vivissecção em termos empíricos, e não há nenhuma justificativa moral para a vivissecção. Mas a esmagadora maioria do público acredita que a vivissecção seja importante para a saúde humana.
Por que as pessoas que consideram aceitável impor sofrimento e morte aos animais por razões de prazer iriam achar que há algo moralmente errado em usar animais para um propósito que elas consideram (erradamente, na minha opinião) necessário e benéfico? Por que as pessoas que estão dispostas a encher suas artérias de gordura animal por gostarem do sabor das comidas de origem animal não estariam dispostas a apoiar a matança de mais animais por pensarem (mais uma vez: erradamente, na minha opinião) que essas mortes adicionais resultarão numa cura para seus problemas de saúde?
A resposta é bem clara: elas não iriam, não vão. Não podem.
Argumentar para as pessoas que comem produtos animais que a vivissecção é moralmente errada é como argumentar para os entusiastas de carros clássicos que guiar por uma razão importante é moralmente errado. Esses entusiastas acham que está certo guiar pela razão trivial do prazer. Por que eles iriam achar que há algo errado em guiar o carro até um consultório para fazer um exame médico, ou guiar até um pronto socorro? E se eles fossem aceitar que guiar por uma razão importante é errado, então sua amada atividade estaria correndo sérios riscos, como questão geral.
É por isso que, apesar dos 200 anos de campanhas contra a vivissecção, a prática não apenas continua, mas também o número de animais usados em experimentos biomédicos está, na realidade, aumentando.
Outras campanhas de um só tema
Agora considerem as campanhas de um só tema que não tratem da vivissecção, tais como aquelas contra determinados tipos de caça esportiva, ou aquelas contra o uso de animais selvagens em circos, ou aquela contra a pele. Essas campanhas são análogas a selecionar arbitrariamente uma destinação e dizer aos nossos entusiastas de carros clássicos que guiar até esse local é errado ou pior do que guiar até uma outra destinação. Eles acham que está certo guiar por prazer, então por que pensariam que guiar até um destino selecionado arbitrariamente é errado?
Mais uma vez: eles não pensariam. Não poderiam.
Semelhantemente, aqueles que consomem produtos animais pensam que é moralmente aceitável impor sofrimento e morte aos animais pelo simples prazer do paladar, e participam desse uso de animais todo dia, diversas vezes por dia. Por que eles iriam pensar que caçar é errado, quando eles vão ao supermercado e compram produtos feitos a partir de animais que sofreram tanto quanto, se não mais ainda do que, os animais que são caçados? Por que iriam pensar que usar animais por outras razões triviais é moralmente inaceitável? Eles comem animais por prazer. E vão a zoológicos e a corridas de cavalos. Por que pensariam que animal selvagem em circo representa algum problema em particular? Eles vestem lã e couro, dois produtos responsáveis por um tremendo volume de sofrimento animal. Por que teriam algum problema com as peles em particular?
É por isso que, apesar de décadas de campanhas de um só tema contra a caça, esse “esporte” persiste; é por isso que a mais longa campanha de um só tema da história da defesa animal – a campanha contra a pele – tem sido um completo fracasso. Embora essas campanhas possam gerar algum interesse, a realidade é que no final das contas elas devem fracassar, numa cultura que considera aceitável o consumo de animais como comida.
Enquanto vivermos numa cultura que não questiona o uso de animais para comida – de novo: não simplesmente o tratamento dado aos animais, mas o uso dos animais – as pessoas em geral nunca abraçarão massivamente as campanhas de um só tema. A maioria das pessoas verá essas campanhas como arbitrárias. A maioria das pessoas reconhecerá que os usos de animais que são o assunto das campanhas de um só tema não são piores que os usos que elas consideram aceitáveis. E elas estão dispostas a participar da exploração desnecessária de animais em todos os dias de suas vidas; por que teriam algum problema com outro uso de animais que também é desnecessário?
Recentemente, conversei com um homem que tinha se envolvido numa campanha contra caçar num determinado parque. Ele se retirou da campanha e me explicou que decidiu que o que os caçadores estavam fazendo não era diferente do que ele fazia ao comprar e comer carne de seu supermercado local, e, já que certamente não estava para desistir da carne, ele não conseguia ver a lógica em se opor à caça.
E é claro que ele estava certo. Caçar é uma atividade horrível, e é muito preocupante que alguém realmente goste de matar um veado ou um coelho. Mas qual é a diferença entre comer os animais que são caçados e comer os animais cujos cadáveres são adquiridos num estabelecimento comercial? Resposta: não há nenhuma diferença. Na realidade, o animal cujo cadáver foi adquirido no estabelecimento comercial pode ter tido uma vida e uma morte piores ainda – mesmo se ele tiver sido um animal “feliz”, criado numa fazenda “feliz” e abatido num matadouro projetado por Temple Grandin – do que o animal que foi caçado.
Estive conversando com uma outra pessoa que, durante anos, esteve envolvida na campanha para cessar a matança de focas com porretadas. Ela se retirou daquela campanha porque decidiu que não havia nenhuma diferença entre a pele de foca e a pele ou a lã de qualquer outro animal, e, como não ia desistir de usar roupas feitas a partir de animais, a campanha pelas focas na realidade era baseada simplesmente no fato de que os grupos de defesa animal podiam tirar partido do fato de que as focas eram adoravelmente fofinhas, e isso não era uma boa base para uma posição moral.
E é claro que ela estava certa. Pele de foca não é diferente de nenhum outro tipo de pele, e pele não é diferente de lã nem de couro. É tudo terrível, e não deveríamos usar nenhuma peça de vestuário de origem animal. Simplesmente não é necessário. Mas então, também não é necessário comer carnes, laticínios, ovos, etc. E enquanto pensarmos que comer animais é aceitável, questionar outros usos desnecessários, ou caracterizar um tipo de uso como pior do que outro uso, parecerá arbitrário porque é arbitrário.
Em 2007, escrevi um editorial de jornal, que foi republicado em 2009, argumentando que as rinhas de cães de Michael Vick não diferiam, em termos morais, do fato de consumirmos produtos animais. Recebi literalmente milhares de respostas àquele editorial. Muitas pessoas concordam com a minha posição; muitas disseram que o editorial as fez pensar sobre o veganismo; muitas disseram que se tornaram veganas depois de pensarem sobre o meu argumento. Mas ninguém – ninguém – que discordava da minha posição foi capaz de articular por que aquilo que Vick fez era pior do que aquilo que o resto de nós faz. Isso é porque não há nenhum modo coerente de distinguir o que Vick fez daquilo que todas as outras pessoas fazem.
Em 2009, quando Vick saiu da prisão e assinou contrato com o Philadelphia Eagles, eu conversei com um homem que me disse que, embora ele fosse um grande fã do Eagles e fosse continuar indo aos jogos do time, ele nunca conseguia gostar de ver Vick jogar por causa da questão das rinhas de cães.  Perguntei-lhe se ele comia cachorros-quentes e hambúrgueres quando assistia aos jogos. Ele disse “sim”. Eu lhe disse que os animais usados para fazer os produtos de que ele gostava tinham vidas e mortes piores ainda do que os cães de Vick.
Ele não teve uma resposta para me dar. É porque não há resposta.
Conclusão
A conclusão é clara: a menos que, e até que, consigamos que as pessoas questionem e rejeitem seu consumo diário e totalmente desnecessário de animais, não conseguiremos que elas se oponham seriamente aos usos de animais que consideram necessários ou não triviais, como a vivissecção, nem aos outros usos desnecessários que veem, corretamente na minha opinião, como escolhidos arbitrariamente pelos defensores dos animais e como não sendo piores do que os usos que elas mesmas apoiam e praticam em todos os dias de suas vidas.
O veganismo deve ser a base, se formos ter alguma esperança de mudar do paradigma dos animais como coisas para o paradigma dos animais como pessoas não humanas.
*****
Se vocês não forem veganos(as), tornem-se veganos(as). É fácil; é melhor para a sua saúde e o planeta. Mas o mais importante é que é a coisa moralmente certa a fazer. Vocês nunca farão mais nada tão fácil e tão gratificante em suas vidas.
Gary L. Francione
© 2011 Gary L. Francione
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Tradução: Regina Rheda

terça-feira, 8 de março de 2011

A ciência dá sua opinião: a reforma do bem-estar animal é inútil

Postado por Gary L. Francione em seu blog em 3 de março de 2011

Caros(as) colegas:
As pessoas que apoiam reformas do bem-estar animal estão todas entusiasmadas. Elas estão mostrando um artigo no Journal of Agricultural Economics intitulado Impacts of Animal Well-Being and Welfare Media on Meat Demand [Impactos do bem-estar animal e da mídia do bem-estar na demanda por carne], e os bem-estaristas alegam que a “Ciência finalmente dá sua opinião: as campanhas por reformas bem-estaristas fazem o público comprar significativamente menos carne”.
Estou conversando com colegas treinados em Economia e Estatística/Desenho de Estudo para apresentar uma resposta completa a esse estudo, que eu acho que padece de múltiplos problemas metodológicos e é mal desenhado. Mas eu diria que mesmo um exame casual do artigo indica que as alegações dos bem-estaristas são, para dizer o mínimo, exageradas.
Primeiro, o consumo de carne está aumentando e não diminuindo. Esse estudo não diz que as campanhas do bem-estar resultaram em uma diminuição real do consumo. Em vez disso, ele diz que a demanda, que foi medida durante um período de aproximadamente dez anos, não aumentou tanto quanto os autores teriam pensado se a atenção prestada pela mídia nas questões do bem-estar não tivesse aumentado. Os autores reconhecem que essa redução no aumento da demanda é “pequena, mas estatisticamente significativa”.
Há muitos, muitos problemas com o estudo. Por exemplo, os autores não foram capazes de encontrar o mesmo resultado “pequeno” no caso das vacas. Além do mais, eles alegam que “essa demanda perdida sai do complexo da carne, em vez de derramar sobre a demanda por carnes concorrentes e aumentá-la”. Mas eles definem o “complexo da carne” como abrangendo vacas, porcos e frangos. O índice menor do aumento da demanda, por pequeno que os autores reconhecem que seja, pode ter desviado para muitos dos outros produtos animais que não são parte desse “complexo da carne” como definido. Os autores também deixam claro que há problemas em ligar os resultados que eles encontraram às preocupações do bem-estar animal.
Em resumo: o consumo geral de animais está aumentando, mas o de porcos e frangos não aumentou tanto quanto o geral, e isso pode ter sido por causa das preocupações do bem-estar animal, mas também pode não ter tido nada a ver com as preocupações do bem-estar animal, e qualquer falha no aumento da demanda pode muito bem estar refletindo uma mudança para peixes, ovos, laticínios e comidas preparadas com carne.
E os bem-estaristas estão entusiasmados com isso?
Nos últimos dez anos, as organizações do bem-estar gastaram bilhões de dólares na promoção de campanhas bem-estaristas. Fora os problemas metodológicos com esse estudo, se isso for o melhor que os bem-estaristas têm para mostrar, então eu concordaria que a ciência realmente deu sua opinião: a reforma do bem-estar é inútil e completamente custo-ineficiente.
Vou postar mais informações sobre uma resposta mais formal à medida que as coisas se desenvolverem.
Se vocês não forem veganos(as), tornem-se veganos(as). É fácil; é melhor para a sua saúde e o planeta. Mas o mais importante é que é a coisa moralmente certa a fazer. Vocês nunca farão mais nada tão fácil e tão gratificante em suas vidas.
Gary L. Francione
© 2011 Gary L. Francione
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Tradução: Regina Rheda

domingo, 6 de março de 2011

E os outros quatro cães?

Postado por Gary L. Francione em seu blog em 3 de março de 2011

Caros(as) colegas:
Na sexta-feira, 25 de fevereiro, um funcionário do controle animal de Oklahoma aplicou injeções letais em cinco cães de rua. No sábado, o funcionário descobriu que um dos cães, um filhote em quem ele havia aplicado duas injeções letais, ainda estava vivo. O filhote foi levado a um veterinário, que colocou uma nota sobre a sobrevivência do cão num website de adoção de animais de companhia. E agora, centenas de pessoas dos Estados Unidos e do Canadá estão tentando adotar o cão.
Por quê?
Milhões da animais sadios são mortos todos os anos, em abrigos, porque ninguém quer esses animais. E agora, como esse cão escapou da morte de uma maneira aparentemente milagrosa, centenas de pessoas querem adotá-lo. Segundo um comentário, “as pessoas estão interessadas no cachorrinho porque a história dele é singular”.
Essa história é semelhante àquelas de animais de fazenda que escapam de matadouros e depois as pessoas lhes dão lares para eles morarem o resto de suas vidas. Eles também são “especiais”. Eles escaparam da exploração institucionalizada que nós estabelecemos. Eles enganaram a morte.
Muitas pessoas pensam que, quando um animal escapa da morte dessa maneira, isso é uma espécie de sinal divino. Ironicamente, esses tipos de eventos reforçam nossa visão de que como não há nenhuma intervenção divina em favor dos outros animais que são mortos em “abrigos” ou matadouros, então é assim que as coisas têm de ser para esses animais. Eles são mortos como parte da ordem “natural”.
Suponho que, se Deus existir, ele(a) está igualmente preocupado(a) com os outros quatro cães que foram mortos na sexta-feira pelo funcionário de Oklahoma, com os outros milhões que são mortos em “abrigos”, e com os bilhões que são mortos simplesmente porque somos tão egoístas que achamos que o prazer do nosso paladar justifica privar um outro ser senciente de sua vida.
E seja qual for o modo de Deus ver a situação, eu sugiro que nossa reação às situações desse tipo deveria nos forçar a pensar sobre por que participamos da injustiça da exploração animal, em vez de pensar que apenas os animais “sortudos” que escapam da nossa injustiça institucionalizada é que importam moralmente.
Se vocês não forem veganos(as), tornem-se veganos(as). É fácil; é melhor para a sua saúde e o planeta. Mas o mais importante é que é a coisa moralmente certa a fazer. Vocês nunca farão mais nada tão fácil e tão gratificante em suas vidas.
E, se puderem, adotem, ou acolham até que alguém adote, um não humano sem lar. Fomos nós que metemos os animais nesta confusão; temos uma obrigação coletiva de ajudá-los a sair dela. Há muitos cães, gatos e outros não humanos sem lar, na sua região. E todos eles são especiais.
Gary L. Francione
© 2011 Gary L. Francione
Adendo – 5 de março de 2011:
Numa reportagem em vídeo de 4 de março da ABC News, Miracle Mutt: Puppy Rises Again, o funcionário do controle animal que tentou matar o cachorrinho falou: “Eu diria que Deus tinha planos para aquele cachorro”. Aparentemente, Deus não tinha planos para os outros que o funcionário matou. Uma outra pessoa comentou que o cachorro é “nosso herói”. “Ele está aqui por uma razão”. Os outros cães não estão aqui por uma razão. Eles não passam de lixo.
Só nos dois últimos dias, houve 44 cães na lista de condenados à morte da cidade de Nova York, mas, segundo a ABC News, há “milhares” de pessoas em todo o mundo querendo adotar o “vira-lata milagroso”. E enquanto assiste à reportagem da ABC, a maioria das pessoas consome uma refeição que inclui carne e outros produtos animais.
Somos uma espécie muito estranha, e a nossa esquizofrenia moral em relação aos animais não humanos certamente mina nossa alegação de que somos superiores devido à nossa racionalidade.
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Tradução: Regina Rheda