sábado, 30 de outubro de 2010

Comentário nº 20: promoção criativa do veganismo não violento em um ambiente desafiador

Postado por Gary L. Francione em seu blog/podcast em 25 de outubro de 2010

Caros(as) colegas:
Neste Comentário, tenho uma longa discussão com dois ativistas veganos abolicionistas, Jeff Perz e Renata Peters. Eles moram em Alice Springs, uma cidade pequena e remota da Austrália central dominada pela indústria do gado, e exatamente o tipo de lugar onde você pensaria que é impossível gerar entusiasmo em relação ao veganismo.
Mas Renata e Jeff provam que é possível haver um movimento vegano em qualquer lugar — se você quiser!
Jeff é canadense; Renata, australiana. Juntos, esses dois veganos, que também são adeptos da comunicação não violenta, conversam comigo sobre como se tornaram veganos, por que são abolicionistas e o que estão fazendo em Alice Springs para educar as pessoas sobre o veganismo.
Renata e Jeff vão lhes mostrar que vocês não precisam de uma organização grande nem de um orçamento alto para promover o veganismo de modo eficaz. Tudo de que vocês precisam é vontade de trabalhar muito e de pensar criativamente sobre a melhor forma de educar a comunidade onde vivem. Doces veganos ajudam!
Achei minha discussão com Jeff e Renata inspiradora, e sei que vocês também vão achar.
No início do Comentário, discuti brevemente uma nova campanha do grupo bem-estarista britânico Animal Aid, que está:
pedindo que se instale circuito fechado de TV (CFTV) em todos os matadouros do Reino Unido, e que o material gravado seja disponibilizado a terceiros fora do matadouro. Também queremos um treinamento independente melhor, retreinamento e avaliação regulares, execução rigorosa das leis, e o fim do emprego em matadouros para aqueles com condenações pendentes por violência ou crueldade contra animais.
Um matadouro, cujo contrato com uma grande cadeia britânica de supermercados foi suspenso depois que o Animal Aid alegou que ele cometia crueldade contra animais, teve seu contrato restabelecido após “melhorias no abatedouro, incluindo a introdução do CFTV” de acordo com as exigências do Animal Aid.
Andrew Tyler, do Animal Aid, comentou:
“O fato de a empresa dizer que seus próprios padrões melhoraram de forma gritante mostra claramente a importância da nossa investigação”.
“Isso ressalta, em termos absolutamente claros, que o que estamos fazendo, e o que continuaremos a fazer, é uma tarefa vital. Estamos muito contentes que o CFTV tenha sido introduzido. É absolutamente vital que as sequências sejam não só coletadas, mas regularmente examinadas por Sainsbury’s e as autoridades reguladoras”, disse Mr. Tyler.
Como vocês poderiam adivinhar, muitos defensores dos animais estão, compreensivelmente, indignados com o fato de o Animal Aid estar agora formando parcerias com exploradores institucionais para promover e vender carne “feliz”.
Uma colega da Grã-Bretanha me escreveu e compartilhou uma resposta que ela havia recebido de Tyler à sua objeção a essa campanha tola. Tyler tentou justificar a campanha pelo CFTV usando o seguinte exemplo:
você está numa feira de gado e vê uma ovelha ser repetidamente chutada na cabeça e pisoteada. Você intervém para acabar com esse extremo abuso ou iria considerar isso “bem-estarista”, dado que, mesmo se você parasse com os chutes e o pisoteio, a ovelha ainda seria abatida?
Ingrid Newkirk da PETA usou o mesmo tipo de argumento há quase 20 anos, quando, no contexto de promover a reforma do bem-estar animal que, alegava ela, nos aproximaria dos direitos animais, ela disse que quem se opunha à reforma do bem-estar negaria água a uma vaca sedenta a caminho do matadouro.
Eu discuti a posição de Newkirk em meu livro de 1996, Rain Without Thunder: The Ideology of the Animal Rights Movement. Argumentei que se eu fosse um guarda de um campo de concentração, eu certamente daria água a um prisioneiro político sendo levado para a execução. Mas se eu concluísse que o campo de concentração para prisioneiros políticos era, em geral, uma instituição imoral e injusta, eu largaria meu emprego e faria campanha para fechar o campo. Eu não faria campanha para dar água aos prisioneiros prestes a ser fuzilados, nem por outras medidas destinadas a acobertar a imoralidade da instituição.
Minha resposta a Newkirk se aplica ao exemplo de Tyler. Sem dúvida, eu faria com que parassem de chutar a ovelha. Imagino que a maioria dos proprietários de ovelhas e operadores de matadouros fariam o mesmo. Afinal, chutar a ovelha causa danos à carcaça, e isso reduz o valor da ovelha. Mas eu faria campanha por um tratamento mais “humanitário” da ovelha? Não, absolutamente não. Isso não faz nada além de acobertar uma instituição inerentemente imoral e deixar o público mais à vontade quanto a comer carne.
E é exatamente isso que o Animal Aid está fazendo. Está encorajando o público a acreditar que há um modo certo e um modo errado de explorar os animais.
Não há. Há somente um modo errado.
As pessoas não deveriam abusar sexualmente de crianças. Mas se elas vão fazer isso, é melhor elas não torturarem as crianças além de abusar sexualmente delas. Mas devemos fazer campanha por um abuso sexual mais “humanitário” de crianças? Não, é claro que não. Não há nenhum modo certo de abusar sexualmente de crianças, assim como não há nenhum modo certo de torturar e matar animais.
É perturbador ver quantos consumidores de carnes e laticínios estão elogiando a campanha do Animal Aid. Mas isso é de se esperar. O Animal Aid está lhes vendendo uma indulgência e, por uma doação, dizendo-lhes que podem continuar explorando, contanto que comprem de um supermercado que obtém sua carne de um matadouro com CFTV.
É realmente apavorante, e eu peço a todos os defensores dos direitos animais abolicionistas no Reino Unido que não apoiem essa campanha equivocada (embora eu tenha certeza de que os bem-estaristas nos Estados Unidos embarcarão nessa caravana também). E por falar nisso, defensores no Reino Unido: por favor, escrevam ao grupo Viva! pedido para ele parar de vender livros de culinária não veganos, parar de promover restaurantes e pousadas não veganos, e parar de representar a ingestão de laticínios como sendo melhor, sob o aspecto moral, do que a ingestão de carnes.
Devo acrescentar que, há 20 anos, Newkirk dizia que devíamos apoiar o bem-estar para nos aproximar mais dos direitos animais. Bem, já são 20 anos depois, e se Newkirk acha que estamos mais próximos — mesmo que seja um centímetro — está se negando a admitir a realidade. E agora temos Tyler apresentando o mesmo argumento ridículo.
Se você não for vegano(a), torne-se vegano(a). É fácil, melhor para a sua saúde e o planeta e, mais importante, é a coisa moralmente certa e justa a fazer. É o que nós devemos aos outros animais. Se você for vegano(a), então eduque os outros sobre o veganismo.
Gary L. Francione
© 2010 Gary L. Francione
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Tradução: Regina Rheda