Chris Hedges escreveu um ótimo artigo, “Retribution for a World Lost in Screens”. Embora Hedges não discuta a questão animal, seu artigo pode nos ajudar a entender o “movimento” de defesa animal atual e por que ele está fracassando. Hedges argumenta que em nossa cultura moderna, focada no computador, nós deixamos de buscar a habilidade de entender ou empatizar; buscamos apenas a autogratificação, a ilusão do empoderamento e a diversão. Quem não pintar uma cara risonha em qualquer problema e não propuser uma solução rápida é descartado como “negativo” e “pessimista”.
Estamos presidindo o tratamento e a matança implacáveis, sem paralelo na história humana, de bilhões de seres sencientes. Isso está ocorrendo bem na frente de nossos olhos. Em vez de nos levantarmos como uma força não violenta unificada para dizer “não” a esse sofrimento e morte inimagináveis, tentamos transformar esse buraco negro moral em entretenimento. Temos festas de gala apresentadas por não veganos, com transmissão de vídeo via streaming que nos permite ver um grupo de patéticos narcisistas recebendo prêmios, mulheres nuas dentro de jaulas “em prol dos animais”, e líderes do bem-estar animal que se associam a exploradores institucionais e nos asseguram que pode-se tratar dos “piores” aspectos da exploração animal por meio de reformas insignificantes, para que possamos simplesmente relaxar e ser felizes porque tudo vai ficar bem — contanto que façamos doações, é claro.
Temos entretenimento constante, desde “conferências”, que não passam de feiras de comércio para corporações grandes de bem-estar animal, até “caminhadas pelos animais”, para que as pessoas preocupadas com os animais possam se encontrar e se sentir bem quanto a expressar seu apoio ao tratamento “humanitário” e à “compaixão”, e a protestar contra o “abuso” — noções vazias e das quais ninguém discorda em termos abstratos, de qualquer maneira. Propõem-nos concursos para desenhar camisetas com slogans sobre fazendas industriais intensivas e nos apresentam filmes sobre projetistas de matadouros “visionárias” que recebem prêmios de grupos a favor dos “direitos animais”.
Dizem-nos que não é nem necessário, nem desejável, dizer “não” a participar da exploração animal sendo vegano e promovendo o veganismo como uma base moral clara. Não é necessário porque as reformas do bem-estar e a exploração “feliz” podem tratar do problema de um modo mais “prático”. Não é desejável porque não queremos que o público fique infeliz, e qualquer solução que exija uma mudança verdadeira pode interferir com a incansável busca por diversão e soluções fáceis. O público pode ir suficientemente bem sendo “onívoro consciencioso” ou “carnívoro compassivo”, e comendo carne ou outros produtos animais que portem um selo “humanitário” patrocinado por esta ou aquela organização grande ligada à causa animal.
Não se tolera que alguém critique a inchada e ineficaz máquina de entretenimento chamada “o movimento”, aliás um nome errado porque não há movimento para lugar nenhum, a não ser para trás. A crítica interfere com nosso desejo de acreditar nos bem-estaristas corporativos que nos dizem que podemos curar o câncer moral assinando um cheque, calando a boca, sentando e assistindo ao show. É como alguém falando na platéia do cinema quando estamos tentando ver e desfrutar algum filme tolo. Interfere com a diversão. E em nossa sociedade — e dentro do “movimento de defesa animal” — esse é o pecado mais grave de todos.
Se o planeta sobreviver e a história nos julgar quanto a alguma coisa, não vai ser que deveríamos ter contribuído mais para as corporações de bem-estar animal para que elas pudessem ter feito campanhas maiores sobre ovos de aves livres de gaiolas ou bezerros livres de baias individuais. Vai ser que, diante da implacável destruição dos seres mais vulneráveis entre nós — humanos e não humanos — ficamos apenas assistindo ao show.
Se você não for vegano(a), torne-se vegano(a). É muito fácil, melhor para a saúde e o planeta. E o mais importante de tudo é que é a coisa moralmente certa e justa a fazer.
Se você for vegano(a), então eduque os outros de um modo criativo e não violento.
O veganismo ético é uma maneira poderosa de dizer “não”.
Gary L. Francione
© 2010 Gary L. Francione
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Tradução: Regina Rheda